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Luísa Castel-Branco

A Terra do Nunca

Luísa Castel-Branco, 30.08.07
    Tenho uma lista enorme das pessoas com quem estou em falta. Falta de uma palavra, de um carinho, da demonstração de que penso nelas.
Os dias correm como se não tivessem mais 24 horas, ou então sou eu que me perco nos minutos e quando reapareço já a noite desce sobre a cidade.
Deito-me e levanto-me a pensar no que tenho que fazer, no verdadeiramente urgente, mas depois são as pequenas coisas que se prendem umas nas outras como os fios de uma meada e não sobra espaço para nada.
A gestão do nosso tempo é também uma arte. Eu sei bem que o meu mal é escapulir-me para lugar nenhum, para aquela “terra do nunca” onde me aconchego e me sinto segura, ousada e sem medos, onde a realidade não penetra.
Deixo-me ficar por lá, ainda que aqui esteja. Posso estar rodeada de gente, posso mesmo parecer participar nas conversas, mas na verdade, em segredo, fujo para a “terra do nunca” e permaneço lá, a revisitar as minhas recordações ou a inventar novos mundos.
Outras vezes, estou a meio de uma tarefa, e evaporo-me sem que ninguém dê por isso. O corpo fica cá, mas o meu espírito e a minha alma e o meu coração, todos de mãos dadas, fogem, correm sem parar até encontrarem esse local onde o silêncio está repleto de sons amigos, onde nada me obriga a representar o papel que me distribuíram, nesta longa performance que é a vida real.
Eu sei que é infantil. E inútil seguramente. Mas é lá que vou buscar as cores para pintar os dias, as imagens que não existem senão numa realidade paralela que é muito mais a minha do que esta que aqui está.
Não é sonhar. Não sei explicar, é algo de diferente. É como se este local secreto escondido dentro de mim fosse o ultimo refugio de tudo e de todos e principalmente, tenho que ser verdadeira, de mim mesma.
Isto tudo porque depois me falta o tempo para as coisas da vida.
Mas necessito desta fuga como do ar que respiro. É lá que estão as personagens do meu livro, agora que me fugiram da minha cabeça e não consigo que os dedos corram as teclas no computador.
É lá que estou eu a brincar com os meus filhos quando eram pequenos.
É lá que está aquela que fui e que acreditava que bastava fechar os olhos e o mundo virava o sonho que sonhava.
Mas volto sempre.
E tenho que vos agradecer a todos, aos participantes desta realidade cibernauta que eu desconhecia.
Desde lado de cá da realidade, vocês são a companhia mais querida e esperada a cada dia, e ligar o computador e procurar as vossas palavras, os vossos comentários, os pedaços de vida que aqui deixam, tornou-se um dos mais doces momentos dos meus dias.
Prometo que vos levo comigo até à “terra do nunca”. Quiçá cada um de vós tem também uma e eu não sei.

Que sei eu?

Luísa Castel-Branco, 26.08.07
Olá Luísa. Vi seu blog e gostei muito. Posso saber qual a sua religião? Acredita em Deus? E na vida depois da morte?
Obrigado.
Ass: Carlos Ribeiro
 
 
O nascer do dia, visto da janela da minha cozinha, é um espectáculo de tal forma soberbo que corta a respiração. O azul começa a aclarar, e depois vira lenta e suavemente uma tonalidade de rosa que se vai espalhando, lambendo as muralhas do Castelo, da Igreja de Santa Engrácia, descendo sobre o casario de Lisboa até se misturar com o verde das árvores.
O rio parece um espelho mágico. Pela manhã as brumas vestem as águas e quando as cores se misturam com a névoa, é como se um reino mágico tivesse aberto a porta e nos convidasse a entrar.
Os pássaros começam a sua dança, num chilrear que vai aumentando de intensidade. E pouco a pouco a Cidade revela-se, como que tirando o xaile com que se cobriu de noite para mil juras de amor.
O leitor Carlos Ribeiro deixou-me a pergunta que aqui transcrevo.
E ao olhar para o nascer do dia, pensei para mim mesma que esta era a resposta.
Só Deus pode ter criado tamanha beleza! Tamanhas belezas espalhadas por todo o lado, fora de nós, dentro de nós.
Como se chama esse Ente Supremo? Deus? Alá? Buda? Ou o velho sentado no jardim, que sorri a olhar os pássaros e as crianças e retorna a casa sem que a solidão, a velhice ou a longa espera da morte o transformem num ser amargo e perdido?
Mas será que realmente importante?
Se comprarmos as religiões, o que as une é muito mais do que as separa.
Todas tentam incutir no ser humano as noções fundamentais: A distinção entre o Bem e o Mal; o respeito pela integridade do outro; amar o próximo.
Sim, amar.
Tudo o resto, tudo o que são actos de extremismo, não têm cabimento em nenhuma religião.
Mas, olhar o nascer do sol sobre Lisboa, o sorriso da minha neta e os seus porquês, olhar tanta coisa que é inexplicável a não ser pelo que não tem explicação, tudo isso me leva a acreditar num Deus, que é superior aos Homens, mas que é Pai e olha para nós com o mesmo sentimento com que nós olhamos os nossos filhos. Às vezes com orgulho, outras com desapontamento.
Claro que dito isto, fica tudo por explicar.
Tenho milhares de perguntas sem resposta possível. Porque há tanta gente a sofrer sem ter feito nada? Porque há tantos com tanto e muitos mais com tão pouco?
Que lotaria celestial determinou que eu nascesse aqui e não nos confins de África ou numa terra de monções, aguardando um furacão?
Perguntas e mais perguntas que aferem a minha falta de Fé.
A minha incompreensão com o viver dos outros que pela confissão lavam os seus pecados e depois voltam, nos dias normais de expediente, a serem as criaturas com mais certezas e maior crueldade.
Por isso o meu Deus é meu. Vejo-o neste nascer do sol, entro numa Igreja quando preciso de estar só, e falo com Ele a qualquer momento.
Mas sei que Ele existe. Já o vislumbrei em tantos momentos!
Quando chegar a minha vez de atravessar o rio para o outro lado, e entrar no outro mundo, gostaria de me sentar com Ele e perder-me a fazer-lhe perguntas!
Por agora, limito-me a acreditar que existe uma profunda diferença entre o Bem e o Mal, que é muito mais fácil seguir o caminho da não exigência connosco e com os nossos actos.
Não sei como serei julgada, mas todos os dias me julgo a mim mesma pelo que falhei e pelo que não fiz ou não disse.
E entretanto, vou olhando Lisboa, o Rio, o verde do Jardim da Estrela, o riso das crianças, perdendo nos livros e deixando palavras perdidas em folhas brancas.

Desculpem-me!

Luísa Castel-Branco, 24.08.07
 
A porta das urgências abre e fecha, fecha e abre num vaivém constante. Tenho os olhos fixos na porta de vidro como se esperasse, não sei, que desaparecesse e com ela o banco de pedra onde estou uma vez mais sentada, o hospital, tudo.
O mesmo banco, o mesmo hospital, a mesma dor a apertar-me o coração. Um ano depois, dois anos depois, há três foi a minha vez mas noutro hospital, noutras portas que abriam com certeza da mesma forma mas que eu não conseguia ver.
A vida é isto eu sei, desculpem-me. Desculpem-me estar para aqui a desabafar, quando tantos têm escrito sobre a tristeza dos meus textos.
Mas tenho medo de hospitais. Tenho medo daquela porta que abre e fecha e não sei se foi a ultima vez que vi quem ali entrou e já não saiu hoje.
A canícula aperta. O banco de pedra ferve. Ao meu lado um homem faz palavras cruzadas. Uma criança incrivelmente gorda pergunta-lhe:”Como te chamas?” e ele nem levanta os olhos do jornal. Do outro lado, a mãe, incrivelmente gorda;”Vanessa, vem para aqui!”. Podia ser outro sítio qualquer, porque há gentes por todo o lado, gente a conversar, a fumar, crianças que correm:”Vanessa eu já te avisei!” mas de repente chega uma ambulância, ou alguém chora alto no átrio do hospital.
Será isto o limbo? Serão as portas de vidro que não param nunca a primeira paragem para o lado de lá?
As lágrimas caiem-me pelo rosto. Eu sei que é a vida. Eu sei que é normal a partir de uma certa idade temos que nos habituar à ideia de que as pessoas partem, eu sei tudo isso, mas as lágrimas são teimosas e correm-me pelo rosto.
A última vez que me sentei neste banco de pedra não voltei a ver quem passou as portas.
Ah! Esta fase da vida em que os outros precisam de nós, em que é chegado o momento de dar a mão e apoiar quem parte, mas onde está a força? Onde está a Fé? Quem me toma a mim nos braços e me tapa os olhos e os ouvidos e diz:”Já passou!” e o hospital desaparece, a dor no meu peito também, e a morte, este viver diário a assistir à alma a apartar-se do corpo, termina?
Sou egoísta. Eu sei, desculpem-me mas estou cansada.
Os dias são uma sequência de portas de vidro que se fecham e abrem sem parar, sem dar sossego e eu apenas vislumbro rostos em sofrimento, e não sei como aprender a dizer adeus.
“Eu vou sentar-me aqui ao pé da Dona Luísa” diz uma senhora aconchegando-se no banco de pedra, entre mim e o homem das palavras cruzadas, e antes que eu tenha tempo para limpar as lágrimas”Gosto tanto de ver a sua filha! E a senhora quando volta à televisão? O meu marido também teve um enfarte porque fuma como a senhora e...”
Colo um sorriso estúpido na cara, e deixo de a ouvir, recolho-me dentro de mim e sorrio como uma boneca de plástico.
Queria ser transparente, mas não sou. Mentira, sou. Sou apenas a senhora da televisão que tem uma filha na televisão.
E ali ao meu lado, sem o écran pelo meio, ela nem repara nas minhas lágrimas.
As pessoas são simpáticas comigo. Não fiz nada que merecesse o carinho que me demonstram:”A Dona Luísa também não deixou de fumar, pois não?”
Ah! As malditas portas de vidro e eu que quero fugir e não tenho para onde!
 
 

...

Luísa Castel-Branco, 22.08.07
Gosto do cheiro da terra molhada. Das gotas de orvalho sobre as folhas e flores, como se fossem pérolas transparentes. Gosto das mutações do azul do céu quando nasce o dia e quando o dia morre. Como se fosse uma tela gigante em que algum Anjo, Arcanjo ou simplesmente uma criança a sonhar, desenhou cores impossíveis de reproduzir.
Gosto das nuvens. Da dança das nuvens que se entrelaçam e formam imagens fantásticas. Se olharmos bem, com os olhos do coração, podemos ver cavalos alados, castelos e carneiros a saltar.
Gosto de todos os verdes que a natureza nos oferece. E são milhares! A maior parte das pessoas passa pelas árvores sem as cumprimentar, sem lhes agradecer a beleza. A maior parte das pessoas acha que uma flor é uma flor e não um acto divino. Uma perfeição que mereceu seguramente longos momentos de reflexão ao Criador.
Os Deuses ou Deus ou apenas o Cosmo, deliciaram-se seguramente a criar os pássaros nas suas tonalidades luxuriantes.
Gosto das pedras. De todas as pedras porque são intemporais e têm histórias por contar.
Gosto do vento porque embala tudo e é a orquestra que conduz uma sonata a quem tudo e todos obedecem. Das cearas às grandes arvores, das saias das senhoras nos passeios de Lisboa, até à roupa no estendal.
Gosto de ouvir a campainha que toca no colégio nas traseiras da minha casa. E as crianças soltam-se e povoam o recreio e os gritos de alegria e os jogos de bola e as meninas com laços.
As crianças são o melhor do mundo. Pessoa tinha razão.
Elas dão-nos sem qualquer esforço, sem o quererem ou saberem, um vislumbre do futuro imenso que têm pela frente, e da limpidez de alma e coração.
Os olhos das crianças não vêem o mundo como nós. E por isso mesmo, só elas, os poetas e os loucos conhecem a verdade.
Gosto de ouvir o latir dos cães pela noite fora.
Recordam-me a minha infância e as ferias passadas no campo, lá onde havia estrelas pregadas no céu como pérolas num vestido de seda, e perfumes tão verdadeiros que ninguém nunca os poderá imitar e muito menos esquecer.
Gosto do cheiro do pão quente. Do café acabado de fazer, do bolo que sai do forno e nós todos agarrados à mesa, as cabeças mal ultrapassando a tábua grande no meio da cozinha e os aromas que se misturam como se fossem um só.
Gosto de histórias felizes. De gente feliz. De fazer os outros felizes.
Gosto de conhecer tanta gente que com tão pouco sabe ser feliz. Porque esses são os detentores de um segredo que vale mais do que o ouro. Porque esses são os verdadeiros heróis.
Gosto de historias de encantar, que começam sempre da mesma forma:”Era uma vez...”
E gosto da chuva. Do cheiro da chuva. Da música da chuva. Dos desenhos que a chuva faz nas vidraças, dos rios que esboça na calçada e que temos a certeza que são tão magníficos como o Tejo e têm caravelas escondidas.
Gosto do silêncio povoado de sons. Do silêncio que as pessoas não ouvem porque estão demasiadamente ocupadas com a necessidade de viver com urgência.
Mesmo em Lisboa, o silêncio da noite é povoado. Há corujas. Os eléctricos roçam os carris como se fossem cavalos à solta. Ao longe ouvem-se vozes e como qualquer criança poderá explicar, são as fadas que brincam sob o luar.
 
 
 
 

Para si

Luísa Castel-Branco, 15.08.07
+
 
Olá Luisa, eu gosto muito de a ouvir gosto mesmo muito, e por isso estou aqui a escrever lhe, eu descobri o seu blog por acaso, ou por ironia do destino não sei, mas é o seguinte eu passei esta ultima noite como muitas outras mal e a chorar porque eu acho "acho não, não tenho mesmo" sorte nenhuma, dormi mal e pus me a pé de manha porque hoje não tenho os miúdos muito raro mas foram dormir ao pai "sou divorciada há 6 anos e meio" mas gosto muito de uma pessoa sou correspondida mas não posso ter uma vida normal, mas continuando acordei e liguei a Tv. no canal 2 e vi uma entrevista sua e falaram no seu mail e eu rapidamente fui a ao computador que tinha acabado de ligar e escrevi o seu mail e qual foi o meu espanto a sua ultima escrita falava de sorte que somos nós que a fazemos será, eu sou uma pessoa pessimista muito pessimista para conseguir alguma coisa consigo com muito sofrimento e depois perco logo a seguir e neste momento da minha vida ando muito triste sem vontade de viver, já me passou pela cabeça matar me ouve ate uma noite que passei acordada na varanda com vontade de me atirar mas quando eu estava mesmo a fazer lembrei me dos meus filhos que estavam a dormir e que naquela altura só me tinham a mim porque o pai na altura "ou seja durante 1 ano não quis saber deles foi preciso ir varias vezes a tribunal para o obrigar a ver o filhos" hoje pensaria duas vezes se o faria, mas continuando lembrei me dos meus filhos e pensei se eu não morro e fico numa cadeiras de rodas o que vai ser pode ser palermice mas veio isso a minha mente não o fiz claro os meus filhos estão a cima de tudo, mas acerca do seu tema será mesmo que basta ser optimista não precisar de fazer nada que as coisas acontece, eu não acredito a minha filha diz me para eu ser optimista e gostar primeiro muito de mim "ela só tem 12 anos" gostar de mim ela deve ter razão, e ser optimista também mas a vida foi tão madrasta comigo que eu já não consigo ser optimista, mas tenho uma coisa e tive sempre que a Luisa disse na Tv. que tinha agora medo, eu tive sempre medo, por isso eu q acho que sou pessimista tenho medo ate tenho medo hoje em dia de viver porque não consigo viver aceitado tudo que a vida me dá.
 
 
Dos mais de 180 comentários que recebi, aos dois post publicados, o seu ficou-me na cabeça, preso entre os múltiplos afazeres diários, sem que o tivesse conseguido esquecer.
Ah! As imagens da dor prendem-se em nós, e mesmo o tempo passado, são como vírus que se alimentam do nosso sangue e das nossas lágrimas.
Sei da sua varanda, da sua janela, das suas lágrimas, da enorme atracção do abismo, do salto no escuro e poder dizer adeus a tudo, absolutamente tudo, mas principalmente à dor maior que não tem nome, é um conjunto de muitas dores, como se dentro de nós se fossem acumulando, dia após dia, as desilusões, os desamores, a culpa, sim a culpa, porque mesmo quando a vida nos bate como se fossemos um saco de boxe, sabemos sempre que há alguém que está pior que nós, que sofre ainda mais.
Sei a atracção do precipício, do salto que é muito mais um voo para o infinito, um voo em direcção às estrelas e aos anjos e arcanjos do que a realidade do corpo estatelado no passeio lá em baixo.
Sei o que é acordar com medo. Há tantas formas de medo e possivelmente ele é uma das maiores forças do Universo, muito para além do sexo ou do poder.
O medo faz-nos correr, correr sem parar. E não sabemos que é medo, chamamos-lhe outros nomes: ambição; gosto pela aventura, desafio, eu sei lá.
Quando na verdade, apenas tentamos não nos afogar nas horas que o dia tem.
Sei o que é olhar para o lado e pensar: mas se eu não faço mal a ninguém, mas se eu me esforço tanto, porque é que a vida é tão madrasta?
E sei o que o único amor infinito, imortal, maior do que a nossa própria vida, é o que sentimos pelos nossos filhos.
E também a mim foram eles que me tiraram, sem saberem, dessa janela, dessa varanda e da vontade que vem das entranhas de abrir os braços e saltar, saltar e nunca mais ter que olhar-me no espelho.
Sei que devemos gostar de nós e ser optimistas, e que por nós passam todos os dias gentes com maiores e mais terríveis sofrimentos.
Mas nunca irá esquecer estas lágrimas, minha amiga.
Nunca.
E mesmo um dia, quando a vida lhe sorrir, não saberá sorrir com a vida e todos a acusaram de ingratidão e muito mais.
Mas a verdade, é que a janela aberta, os pés na borda da varanda e o salto que não foi, ficam dentro de nós como se tivesse sido.
Apenas os filhos nos podem dar o futuro. E se tivermos coragem de não lhes roubar a vida, a alegria, de não os matarmos de tanto os amar, então um dia cada coisa estará no local preciso, mesmo que para nós não faça sentido.
Porque nunca ninguém nos disse como ia ser difícil.
Porque nos encheram a cabeça e a almofada de príncipes encantados e estórias de felizes para sempre.
E nós para aqui ficamos, sem perceber onde foi que falhámos.
Há momentos na nossa existência que a solidão nos pesa como um casaco molhado.
Há outros em que já não temos lágrimas nem sequer animo para nos levantarmos da cama.
Noites em branco. Fins-de-semana em branco sem o som dos risos dos nossos filhos, e o mundo desaparece de vez.
Quando me diz que ama e é correspondida mas...não acredite.
Só vimos o que queremos ver. E quando o desespero é tão grandes que não encontramos razão para continuar por aqui, temos tendência para aceitar migalhas.
Não precisa acreditar nestas minhas palavras.
É muito mais fácil reduzir-me aquela que aparece na televisão e portanto conseguiu alcançar o que os outros não têm.
Não, não acredite nas minhas palavras mas se no seu intimo se aperceber de que sei do que fala, então aceite a minha experiência.
As palavras da sua filha, os pequenos mimos que eles nos dão, olha-los no quarto escuro enquanto dormem, garanto-lhe que isto basta.
Não lhe digo que vai ser feliz. Mas digo-lhe que vai existir como um ser inteiro.
Tão inteiro e poderoso, que é capaz de escrever o que me escreveu.
Quando sentir a dor apertar dentro de si, olhe para a varanda.
E, tal como aconteceu antes, pense neles.
Pense que não pediram para nascer mas que ao nascerem lhe deram o infinito na palma da sua mão.
Nada, absolutamente nada mais interessa.
Escreva sempre, mas sempre que precisar.
 
Um abraço grande,
 
Luísa
 
 
 
 

A VIDA

Luísa Castel-Branco, 08.08.07
A VIDAAndo à procura das palavras para vos agradecer todos os comentários que fizeram ao meu renascido Blog.
Pelos vistos, não sou só eu que estou presa em Lisboa, que estou presa na vida, neste dia a dia que em nada se assemelha aquilo que um dia sonhei.
É engraçado, que ao longo da minha vida a imagem que os outros têm de mim esteja sempre tão longe da realidade.
Comecei a fazer televisão aos 46 anos, e foi unicamente uma ampliação, ainda que gigante desta discrepância entre o que sou realmente e a imagem que transmito.
O irónico, é que nunca houve em mim intenção de ludibriar os outros, de levar ao engano, fazendo-me passar por alguém forte, seguro, sem medos, sem dúvidas.
Mas agora que perdi o riso solto, a resposta na ponta da língua, o mergulhar de cabeça em tudo como se eu pudesse mudar a vida de alguém, agora quando olho para aquela que fui apercebo-me de que era fácil ficar com essa impressão digital de mim enquanto ser humano.
Talvez, não, seguramente, de tanto tentar esconder o buraco que sempre viveu na minha alma, eu tenha sido ruidosa, intrometida nos assuntos de quem conhecia bem ou mal, opinativa, enfim, uma enorme lista de características que sei que tive.
E arrogante.
Muitas vezes mo disseram e eu, que tinha um coração demasiado grande e uma ausência total de bom senso, não me reconhecia arrogante, pelo contrário, acreditava genuinamente que havia sempre algo que podia fazer por alguém.
Tenho saudades dessa jovem que fui, dessa mulher que fui.
Olho-a hoje com um distanciamento que me permite perceber que ela estava destina a bater com a cabeça nas paredes da vida, e que a sua personalidade era de tal forma infantil que ficou presa num mundo imaginário, no que a vida podia ser até ao limite.
Depois cheguei eu.
Por acaso, ou não, depois do AVC sofri profundas alterações de personalidade. Nada de extraordinário. Acontece quase sempre mas os médicos preocupam-se mais com as consequências físicas do que com as da alma.
E a minha alma mudou. Tornei-me silenciosa. Perdi toda e qualquer vontade de tentar explicar seja o que for aos outros.
Tenho saudades daquela que fui.
Era um pouco imbecil, era naif, era tanta coisa mas era um ser humano pronto a embarcar em qualquer luta, em qualquer sonho.
Hoje sou uma mulher madura e com bom senso.
Sempre me horrorizou esta expressão: Bom Senso!
Mas afinal o que é a maturidade senão o deixar cair os braços e perder a coragem de sonhar, aceitar a vida como ela é e apenas isso?
É na escrita que encontro o meu nirvana. A evasão desta que eu sou e às vezes, poucas, consigo mesmo tocar a outra que fui.
Para aqueles com quem convivo no dia-a-dia, sou uma pessoa muito mais fácil e cordata.
Para os poucos que me amam e me conhecem de verdade, som um “work in progress” porque sinto que aguardam que a outra que fui volte a qualquer momento.
Mas se algo se manteve, foi sem dúvida esta incapacidade de ser feliz daquela forma natural em tantos.
Acredito que existem momentos felizes, mas que é impossível ser feliz em permanência.
Assim um pouco como a paixão. Quando acontece e enquanto dura devora-nos as entranhas e torna-nos cegos e surdos.
E depois esmorece porque por definição não é um estado normal, e a manter-se pode destruir-nos.
Ao longo da minha vida tenho conhecido pessoas capazes de ser felizes com muito pouco, com vidas difíceis.
Digo para mim mesma que talvez alguns de nós estejamos programados para ter essa capacidade e outros não.
 
É bom estar aqui convosco nesta amena cavaqueira.
Porque o silêncio pesa. Porque, não sei se vos acontece, mas cada dia me parece mais difícil encontrar alguém conversar.
Não falar sobre os outros, não aquela conversa do diz-se diz-se, mas sim o prazer de trocar ideias, trocar sentimentos, procurar em cada um de nós o quanto somos diferentes, e contudo, como somos iguais.
 
Afinal, veio-me agora à memória, a nossa conversa anterior, os vossos comentários e estas minhas palavras são tão velhas como o mundo.
 
“De onde vimos. O que somos. Para onde vamos”
 
Gaugin conseguiu dizer tudo na sua tela e nós por cá continuamos presos no mesmo limbo.
 
 
  

O SEGREDO DO SEGREDO

Luísa Castel-Branco, 03.08.07
Por vezes é necessário parar.
O dia a dia sufoca-nos e retira-nos a capacidade de ver para além da circunstância em que estamos.
Vem isto a propósito do livro “O Segredo” de Rhonda Byrne, editado pela Lua de Papel, que já vendeu em 33 países mais de 100 mil exemplares.
Assisti há dias a uma conversa entre amigos sobre o tema e procurei saber mais.
O livro está a gerar controvérsia, com apoiantes fervorosos e outros a acusaram-no de ser mais uma “fast-food” para a alma.
Mas de que se trata e porque é que se prende com o inicio deste meu texto?
 
“…Parte-se do principio de que, sendo o universo feito de energia, tudo o que pensamos e sentimos se materializa nas situações de vida para o melhor e para o pior.
…Peça o que quer, acredite e não se preocupe com o modo de alcançar o seu desejo. Ele vai cumprir-se, graças à Lei de Atracção, conceito-chave do livro.” (in Visão)
 
Óptima forma de sintetizar o conteúdo desta obra, cheia de depoimentos sobre vidas de pessoas que se alteraram profundamente ao conhecerem e aceitarem o Segredo.
Esta é mais uma obra de auto ajuda, das muitas que têm sido publicadas em todo o mundo.
E a questão básica é porque precisamos nós todos de ajuda, num momento de prosperidade, pelo menos além fronteiras, de liberdade plena, enfim, quando uma boa parte da humanidade parece ter acesso a tudo.
O problema, é que mesmo com o acesso a bens materiais, a tudo o que o dinheiro compra, falta-nos o resto.
E o resto é esta fome de infinito, ou se preferirem, esta demanda permanente da razão das coisas.
Tentamos desesperadamente dar sentido à vida, ou procurar o sentido da vida, e não encontramos a resposta.
Por isso, se eu acreditar no Segredo e focar o meu pensamento no que quero alcançar, e acreditar piamente que a Lei da Atracção vai funcionar, então encontro a esperança em alcançar os meus desejos e sonhos.
Claro que há um fundo de verdade nesta premissa avançada pelo livro.
Se eu tiver uma postura negativa perante a vida, se eu duvidar de mim constantemente, se eu culpara a má sorte (o que quer que isto queira dizer) ou os outros por todos os revezes, então nunca irei ser capaz de construir um futuro.
Mas, se eu me sentar na minha sala, a olhar com clareza o meu objectivo (seja ele qual for) e não mexer um dedo, seguramente que a dita Lei da Atracção vai dar de caras com a porta fechada e nada mais!
Voltemos pois ao início desta nossa conversa.
Por vezes, é necessário parar.
Obliterar todos os sons, refugiarmo-nos dentro de nós e equacionar de uma forma fria o que é a nossa vida, se é isso que queremos, e principalmente como nos vemos daqui a cinco ou dez anos.
Porque se procurar-mos bem, sem o barulho dos dias, podemos encontrar algo que nos faria feliz.
E se tivermos que mudar toda a nossa vida para alcançar esse sonho, é altura de o fazer.
A felicidade dá muito trabalho a construir. Mas arrastarmo-nos pela nossa curta existência sem a saborear, só pode transformarmo-nos em seres infelizes e amargurados.
Por isto tudo, roube ao mundo uns preciosos minutos para si.
E olhe o futuro.
O segredo, no fim de contas, é acreditarmos em nós mesmos e também aprender a gostar de nós.