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Felizmente que somos livres de gostar ou não do que lemos, e de quem o escreve. Pessoalmente, sei que me arrisco mais por escrever sobre sentimentos, estados de alma, se quiserem, em vez de falar sobre a actualidade. É bem mais fácil resguardar-me por detrás do aumento alucinante do endividamento das famílias portuguesas, da falência do sistema de segurança social, da qualidade ou falta de qualidade do sistema de ensino ou de saúde, etc. Quem lê, pode ou não concordar, mas estamos a falar de coisas concretas.
Para alguns leitores do Destak , a minha escrita é uma perda de tempo. Outros leitores respondem-lhes e toda esta troca de opiniões é estimulante. Mas a razão deste texto é o comentário que é hoje o título desta crónica. Fosse eu um homem e o que me mandaria o RIMTIMTIM (?) fazer? Que tipo de insultos se podem atirar à cara ou à escrita masculina? - Vai ver futebol? Não, isso só abona em favor deles... - Vai às "meninas"? Homem que é homem assim o faz, sejam as ditas "meninas" quem forem...
Não me recordo de um único insulto que se possa dar a um macho que não seja sobre as mulheres da sua vida! Já repararam bem? O que tira qualquer homem do sério está sempre ligado à dignidade da esposa, mãe, irmã, ou filha. Querem maior machismo do que isto? E ainda me perguntam porque sou femininista!
Quanto aos leitores que se sentem incomodados com a minha prosa, estejam descansados que eu não me incomodo nada. Cheguei aos 53 anos e é-me totalmente indiferente o que os outros pensam. Vou continuar a escrever sobre sentimentos. Se não gostam, virem a página!
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Todos o diziam: «vais ver que te habituas, pá!», afiançavam os amigos enquanto outros iam mais longe: «é como voltar ao tempo de solteiro. Vais-te divertir à grande!». Donde, devia ser verdade. Mas, por enquanto, a única coisa que sentia era um peso enorme, um peso que lhe fazia um buraco no estômago.
O silêncio da casa, as noites longas sem os ouvir a chamar por ele. Tudo arrumado. Tudo limpo e asséptico, como se ali já não vivesse ninguém e ele fosse apenas um fantasma que não deixava impressões digitais.
Nunca, nem nos piores pesadelos, sonhara que seria um pai de fim-de-semana. Exactamente como fora o seu. Com a diferença abismal de que ele sempre estivera presente, sempre estivera ao lado deles, a partilharem brincadeiras e sonhos.
E agora, porque o amor acabara entre dois adultos, ou só para um deles, não importava, agora tinha à sua frente todos os dias e noites em branco. Ver os filhos de quinze em quinze dias, era nada.
Nada. E sem saber como, a guerra que tinha estalado entre os dois adultos fizera deles os únicos prisioneiros. Ele chegava a casa e ficava a olhar à volta como se estivesse aparvalhado, como se se tivesse enganado na porta e entrado pela casa dum vizinho. Era uma questão de tempo.
Mas enquanto o tempo não vinha, ele sentava-se, noite após noite, no quarto dos miúdos, as lágrimas a correrem pela cara, os olhos perdidos nos desenhos mal colados nas paredes. Podia dizer quantas horas faltavam exactamente para os voltar a beijar. Mas só ali, tão-só como se estivesse nu, podia deixar correr as lágrimas. Fora da porta daquele quarto, colava uma expressão no rosto e dizia em voz alta: «É tudo uma questão de tempo!»
Publicado in DESTAK
P.S.
Obrigado a quem me avisou do erro ortográfico
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Saiu de casa a correr, atrasada para apanhar o autocarro, a mala a abarrotar e a bater-lhe no peito, o suor a escorrer pelo rosto, a empapar-lhe o cabelo. A chuva miúda tinha transformado as pedras da calçada em tecido mole, e ela a fazer força nos sapatos para não cair, ao mesmo tempo que acelerava os passos, o coração a bater forte.
Eram oito horas de um dia cinzento, peganhento e quente, e ela já estava exausta. Levantara-se, arranjara os miúdos, pegou neles, nas lancheiras, nos casacos e correram para o autocarro. Depois de os deixar na escola, ali estava ela, em pé, a tentar segurar-se na pega do segundo autocarro, entalada entre gente desconhecida, a pensar que ia chegar atrasada ao trabalho, no que havia de fazer para o jantar, na roupa para passar, que aquela chuva miudinha não deixava secar nada.
Foi aí, entre um abanão e uma pisadela e lá à frente duas mulheres que discutiam, foi aí que deu por ter perdido o sorriso. Pensou para si mesma que teria ficado pelo caminho, com as pressas. Ou na cozinha, ou no quarto, talvez na mesa-de-cabeceira, junto à imagem da Virgem. Logo, quando chegasse a casa, tinha que o procurar. E assim, despedida do seu sorriso, foi trabalhar, cumpriu o ritual dos seus dias.
Quando entrou a porta, recordou-se do seu sorriso, e ainda deu uma volta rápida à procura. Mas o tempo urgia para tanta coisa, que desistiu. Anos mais tarde, quando o marido a deixou, ela recordou aquele dia, e o cheiro da chuva e sentiu que fora ai que tudo começara. Quando perdera para sempre o sorriso.
Publicado in DESTAK
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