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Luísa Castel-Branco

Natal não era assim

Luísa Castel-Branco, 19.12.07

Os dias escurecem muito cedo, o frio chegou finalmente e a natureza voltou ao seu ritmo normal, com a folhagem das árvores a cobrirem os passeios como tapetes. Lisboa este ano está pobre de luzes. Os enfeites que adornam noutros anos as avenidas e as ruas quase que desapareceram. Sinais dos tempos, da crise, mas a verdade é que a cidade assim despida fica mais triste e não nos deixa esquecer os tempos que correm.

Longe vão as festas natalícias em que os presentes eram poucos e simbólicos, quer se tivesse dinheiro ou não. Não havia consumismo porque não havia onde consumir. Ou talvez porque éramos ainda virgens nesta vertigem das compras por atacado, por obrigação, a longa lista de presentes obrigatórios, e o dinheiro que não chega! Quantos na grande cidade ainda confeccionam a sua ceia de Natal e fim de ano? Quem tem tempo? Quantos ainda o sabem fazer? As tradições vão desaparecendo com a voragem do tempo, e sobra o resto do País, onde por essas cidades, vilas e lugarejos se comemoram as festas de uma forma bem mais verdadeira.

Porque a questão não é só financeira, é também do próprio espírito da quadra que desapareceu dos nossos corações no meio de tantos problemas, tantas listas de obrigações. E depois, o Natal de quem não tem Natal. Dos sem-abrigo, das crianças pobres. O outro lado da realidade aqui tão perto de nós que preferimos ignorar. Mas por mais que isto tudo nos venha à cabeça, basta olhar uma criança com um ar espantado e um sorriso imenso nos lábios especada perante um Pai Natal qualquer, para que tudo valha a pena.

in Destak 18.12.07

Proibições

Luísa Castel-Branco, 14.12.07

O tabaco faz mal. O tabaco mata. Por acaso, a poluição dos grandes centros urbanos não. E o tipo de alimentação que os portugueses fazem é excelente para a saúde: gorduras em excesso, sal em excesso, etc.

Por acaso, o álcool não faz mal. Nem mata. Nem é responsável por inúmeros acidentes de automóveis com o inacreditável número de vítimas.

E outra coisa que não faz mal nenhum é a venda de shots a miúdos de 12 e 13 anos aos olhos de todos. Sabem o número de comas alcoólicos por fim-de-semana só na Grande Lisboa? E a idade dos pequenos?

Quanto à droga, é coisa para nos levar a ter muita peninha de quem padece do mal. Pois. E qualquer pessoa que ande a pé no Bairro Alto sabe bem quantas vezes lhe é oferecida a panóplia completa, tipo "droga a la carte", é só escolher.

As discotecas em Lisboa fecham a água das casas de banho para os meninos e meninas serem obrigados a pagarem a dita, porque o ecstasy dá uma sede dos diabos. Pois, mas o importante mesmo é proibirem o tabaco!

E a violência nas escolas, na noite, em casa?

Claro que é resultado do tabaco! Logo, uma vez que a nova Lei vai entrar em Janeiro, podemos todos estar mais descansados.

Todos os problemas estão terminados. Como fumadora, tenho consciência que o tabaco me faz mal. Sou maior de idade e se ainda não consegui acabar com o vício, sim, vício, o problema é meu.

Tenho perfeita consciência de que não se fuma numa ambiente com pouco ar e com crianças, ou outras pessoas a quem o tabaco incomode.

Mas recuso-me a aceitar este "politicamente correcto" importado via EUA e que se espalhou pela Europa.

Problema meu? Não sei. Porque talvez o Estado devesse olhar também para os fumadores como pessoas que necessitam de "salas de chuto" em vez de criminosos!

in Destak 11.12.07

Hoje

Luísa Castel-Branco, 10.12.07

Escreve texto felizes, dizem-me. Coisas alegres. Escreves sempre sobre o mesmo, apontam-me.

Faz de conta que és outra pessoa, alguém me dizia outro dia.

Mas é isso mesmo que faço todos os dias, fora deste espaço de liberdade.

Transporto-me pela vida sem carregar os outros com as minhas dores, ou tristezas, ou estados de alma, ou simplesmente reflexões sobre a justiça da ordem das coisas. Porque tenho tantas perguntas por responder e tantas mas tantas revoltas interiores.

Portanto recuso-me aqui, pelo menos aqui, a ser a outra que sorri porque ninguém tem que carregar com as minhas queixas de alma ao desbarato, desorientada sem saber bem para onde ir ou porque questiona a todo o momento tudo.

As historias felizes não tem historia.

Haverá efectivamente pessoas felizes ou apenas momentos na vida em que sentimos esse estar especial de quem voou para as nuvens e lá se deixou estar?

Conheço tanta gente, se calhar a maior parte das pessoas com quem me relaciono, que não questionam o porquê do dia a dia ser como é, para elas próprias , para os outros.

Mas eu vivo como uma criança que não passou a fase de perguntar permanentemente porque.

E não escrevo só sobre mim, muito pelo contrario.

Muitas vezes roubo historias de vida a gente que mal conheço, ou um simples olhar perdido do homem sentado no café.

Tudo serve para conjecturaras sobre os seres humanos.

E se a minha janela dá directamente para o recreio dos meninos que brincam e pulam e riem, eu não consigo deixar de pensar na noticia que li hoje da criança de três anos espancada que aguarda no hospital que a justiça determine para onde vai.

Os meus filhos dizem que eu não sei ser feliz. Mais gente que me ama ou me amou o disse.

Mas para mim isto é apenas estar viva.

Dizeer adeus

Luísa Castel-Branco, 04.12.07

Dizer adeus naquele momento parece ser o mais doloroso. A missa, as pessoas em lágrimas, nós em lágrimas, os rituais, os abraços e uma vez mais as lágrimas. Mas afinal, a morte não é isso, nem a partida do corpo nem as despedidas sentidas é tudo o resto, todos os dias que sobram.

Segue-se um vazio tremendo, de vez em quando até esquecemos que a pessoa já cá não está, entre nós, e introduzimo-la na conversa, nos momentos do dia-a-dia. Até que nos damos conta que não é assim. Resta então essa imensa capacidade que temos de sobreviver, de tomar fôlego e andar em frente, mas não estamos sós, porque ao nosso lado, bem ao nosso lado, vai uma sombra a par.

A morte nunca é justa, tal como a vida não o é. E é nessa depuração das tristezas e dos ressentimentos, que vamos fazendo o caminho. Mas amar, das mais diferentes formas que o amor toma, é sempre um bálsamo para a alma. Mesmo que naquele momento só signifique mais dor, a verdade é que ninguém morre enquanto houver uma única pessoa que o relembro com saudade. A memória é uma bênção dos deuses. É aí que vamos buscar o alimento para a vida, e é aí que guardamos o que foi e já não é.

A amizade é a outra forma do amor, e dá-la e recebê-la torna-nos seres humanos muito melhores. É isso que significa envelhecer. É ver partir, chorar e depois sorrir com as lembranças e sempre que possível, dizer a alguém o quanto gostamos, o quanto essa pessoa é importante para nós. O que podemos ambicionar é que a idade nos leve o pudor das palavras e nos dê maior dimensão à alma.

in Destak 4.12.07