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Luísa Castel-Branco

A verdadeira Alice

Luísa Castel-Branco, 19.01.10

 

Entrou na igreja e saboreou o silêncio profundo. Ninguém apenas as figuras dos santos, também elas absortas na sua própria vida.
Descansou o corpo no banco duro de madeira. E para ali ficou sem se mexer. Por alguns momentos, não muito, que a vida a esperava, do lado de lá da pesada porta de madeira, podia ser ela mesma. O seu rosto foi desfazendo a mascara que transportava, como se estivesse coberto por várias camadas de cera, e o sorriso, o seu sorriso desapareceu por completo. "Que simpática que é a Alice! Sempre bem-disposta!"

A verdadeira Alice estava ali sentada, o rosto opaco, as rugas marcadas e a tristeza que lhe comia os olhos deixando apenas dois buracos e nada mais. Possuía tantos sorrisos, como se fossem uma colecção de caixinhas minúsculas, ou daqueles dedais tão finos, de porcelana pintada. Um sorriso para os colegas de trabalho, outro para os filhos, outro ainda para o marido, a família dela, a família dele, era um rosário que parecia não acabar.

Mas ali sentada, o velho sacristão movia-se com dificuldade junto ao altar, finalmente sozinha podia arrancar os malditos sorrisos e ser ela mesma. Cada um sobrevive como pode, pensava para si. Ela sorria para os outros e chorava para dentro, envergonhada e em silêncio. Mas sabia que chorava porque sentia as lágrimas que ninguém podia ver. Onde estava aquela rapariga que em tempos fora, tão cheia de vida, tão plena de sonhos e certezas? Nesse tempo o seu sorriso era verdadeiro mas depois veio a vida, vieram as contas, as desilusões e pior de tudo, veio a sua imagem no espelho, onde via apenas aquela que falhara o seu próprio futuro.

O tempo terminara, tinha que voltar. Desceu as escadas de pedra, endireitou o casaco gasto e vestiu-se de ser vivo, uma vez mais

 

in 19 | 01 | 2010 Destak

Manuel Luís Goucha

Luísa Castel-Branco, 07.01.10

 

05 | 01 | 2010  
A linha que separa o humor da afronta é muito ténue. Seja esse humor dirigido a pessoas, grupos sociais ou a uma nação. Por sorte nossa, vivemos num país pequenino, e se algum cartoonista ou qualquer outro humorista decidir fazer uma rábula a Maomé, não haverá atentados à bomba e outras consequências do mesmo género. Mas a coberto da liberdade de expressão fazem-se insultos gratuitos e ainda por cima quem não acha graça é que está errado.

Vem isto a propósito do que aconteceu no programa 5 para a meia--noite, na RTP2. Se já viram o programa sabem que é um programa onde o humor se mistura com as entrevistas, e muitas vezes o resultado alcançado é bastante interessante. Mas perguntar a um jovem apresentador de televisão quem é a melhor apresentadora e apresentar-lhe três nomes, sendo um deles o de Manuel Luís Goucha, só terá graça para quem escreveu a pergunta e ninguém mais.

Se o ridículo matasse, metade deste país já tinha caído para o lado! Andam para aí todos a discutir se sim ou não ao "casamento" ou "união" dos homossexuais, e depois as mesmas pessoas tão "prá-frente", tão jovens e politicamente correctas, são aquelas que insultam quem se assume, com profunda dignidade como pertencente a essa minoria.

Eu, por mim, estou farta de tantos adolescentes pouco mais que incultos, provenientes de uma geração praticamente analfabeta, criados na arrogância de que ser jovem é poder tudo. Até insultar quem há mais de 20 anos se apresenta diariamente perante todos os portugueses, com o profissionalismo e humanidade que lhe são reconhecidos pelo grande público

in Destak 05 | 01 | 2010