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Luísa Castel-Branco

A VIDA

Luísa Castel-Branco, 08.08.07
A VIDAAndo à procura das palavras para vos agradecer todos os comentários que fizeram ao meu renascido Blog.
Pelos vistos, não sou só eu que estou presa em Lisboa, que estou presa na vida, neste dia a dia que em nada se assemelha aquilo que um dia sonhei.
É engraçado, que ao longo da minha vida a imagem que os outros têm de mim esteja sempre tão longe da realidade.
Comecei a fazer televisão aos 46 anos, e foi unicamente uma ampliação, ainda que gigante desta discrepância entre o que sou realmente e a imagem que transmito.
O irónico, é que nunca houve em mim intenção de ludibriar os outros, de levar ao engano, fazendo-me passar por alguém forte, seguro, sem medos, sem dúvidas.
Mas agora que perdi o riso solto, a resposta na ponta da língua, o mergulhar de cabeça em tudo como se eu pudesse mudar a vida de alguém, agora quando olho para aquela que fui apercebo-me de que era fácil ficar com essa impressão digital de mim enquanto ser humano.
Talvez, não, seguramente, de tanto tentar esconder o buraco que sempre viveu na minha alma, eu tenha sido ruidosa, intrometida nos assuntos de quem conhecia bem ou mal, opinativa, enfim, uma enorme lista de características que sei que tive.
E arrogante.
Muitas vezes mo disseram e eu, que tinha um coração demasiado grande e uma ausência total de bom senso, não me reconhecia arrogante, pelo contrário, acreditava genuinamente que havia sempre algo que podia fazer por alguém.
Tenho saudades dessa jovem que fui, dessa mulher que fui.
Olho-a hoje com um distanciamento que me permite perceber que ela estava destina a bater com a cabeça nas paredes da vida, e que a sua personalidade era de tal forma infantil que ficou presa num mundo imaginário, no que a vida podia ser até ao limite.
Depois cheguei eu.
Por acaso, ou não, depois do AVC sofri profundas alterações de personalidade. Nada de extraordinário. Acontece quase sempre mas os médicos preocupam-se mais com as consequências físicas do que com as da alma.
E a minha alma mudou. Tornei-me silenciosa. Perdi toda e qualquer vontade de tentar explicar seja o que for aos outros.
Tenho saudades daquela que fui.
Era um pouco imbecil, era naif, era tanta coisa mas era um ser humano pronto a embarcar em qualquer luta, em qualquer sonho.
Hoje sou uma mulher madura e com bom senso.
Sempre me horrorizou esta expressão: Bom Senso!
Mas afinal o que é a maturidade senão o deixar cair os braços e perder a coragem de sonhar, aceitar a vida como ela é e apenas isso?
É na escrita que encontro o meu nirvana. A evasão desta que eu sou e às vezes, poucas, consigo mesmo tocar a outra que fui.
Para aqueles com quem convivo no dia-a-dia, sou uma pessoa muito mais fácil e cordata.
Para os poucos que me amam e me conhecem de verdade, som um “work in progress” porque sinto que aguardam que a outra que fui volte a qualquer momento.
Mas se algo se manteve, foi sem dúvida esta incapacidade de ser feliz daquela forma natural em tantos.
Acredito que existem momentos felizes, mas que é impossível ser feliz em permanência.
Assim um pouco como a paixão. Quando acontece e enquanto dura devora-nos as entranhas e torna-nos cegos e surdos.
E depois esmorece porque por definição não é um estado normal, e a manter-se pode destruir-nos.
Ao longo da minha vida tenho conhecido pessoas capazes de ser felizes com muito pouco, com vidas difíceis.
Digo para mim mesma que talvez alguns de nós estejamos programados para ter essa capacidade e outros não.
 
É bom estar aqui convosco nesta amena cavaqueira.
Porque o silêncio pesa. Porque, não sei se vos acontece, mas cada dia me parece mais difícil encontrar alguém conversar.
Não falar sobre os outros, não aquela conversa do diz-se diz-se, mas sim o prazer de trocar ideias, trocar sentimentos, procurar em cada um de nós o quanto somos diferentes, e contudo, como somos iguais.
 
Afinal, veio-me agora à memória, a nossa conversa anterior, os vossos comentários e estas minhas palavras são tão velhas como o mundo.
 
“De onde vimos. O que somos. Para onde vamos”
 
Gaugin conseguiu dizer tudo na sua tela e nós por cá continuamos presos no mesmo limbo.
 
 
  

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